QUADRO A QUADRO - Tartarugas Ninja e o Rei dos Quadrinhos: Um Crossover Além da Realidade

Em Donatello – Edição Especial: Kirby e o Cristal de Dobra, publicada pela Mirage Studios em 1986, os criadores Kevin Eastman e Peter Laird prestaram sua homenagem ao “Rei dos Quadrinhos” de forma silenciosa, mas monumental. Donatello, o mais científico dos irmãos, conhece um artista solitário chamado Kirby, um homem de olhar cansado, mãos manchadas de tinta e um coração repleto de mundos ainda não nascidos.

Em meio a papéis espalhados e desenhos inacabados, Donatello descobre o segredo que move o universo daquele homem: um cristal misterioso, preso na ponta de um lápis comum — um artefato tão simples e, ao mesmo tempo, tão divino. Com aquele cristal, cada traço feito por Kirby ganhava vida. Linhas se transformavam em seres, sombras em montanhas, e o branco do papel abria-se como um portal para dimensões onde tudo era possível.

Donatello, cientista e inventor, observa o fenômeno com espanto e encanto. Pela primeira vez, ele vê a arte ultrapassar a ciência — vê o impossível se tornar real não pela lógica, mas pelo puro poder da imaginação. O artista e a tartaruga cruzam o portal criado pelo lápis e mergulham em um universo onde o sonho é lei. Um mundo vibrante, povoado por criaturas impossíveis, guerreiros lendários e paisagens que parecem pulsar com a energia do próprio cosmos. Era como caminhar dentro de uma página viva, onde cada cor, cada forma e cada centelha lembrava o traço inconfundível de Jack Kirby.

Ali, Donatello entende que está diante de algo maior que qualquer invenção — algo que a ciência jamais explicaria. Kirby não apenas desenhava: ele criava. E, como todo criador, carregava o fardo e a beleza de dar vida ao que antes não existia.

Mas quando chega a hora de retornar, o inesperado acontece. O portal começa a se fechar, como se o próprio mundo imaginário quisesse reter seu criador. Donatello tenta ajudar, estende a mão, mas o vórtice se contrai com força, e apenas ele consegue atravessar de volta. O artista fica preso do outro lado, desaparecendo entre as cores e formas de sua própria fantasia.

Do outro lado, no silêncio do ateliê, Donatello encontra um único papel sobre a mesa, com um recado escrito à mão:“A vida é agridoce no Máximo, Se cuida. kirby.”

Mais tarde, o herói compreenderia o significado daquela mensagem. Kirby não havia sido aprisionado — havia escolhido permanecer no mundo onde a imaginação nunca morre. Um gesto poético, uma metáfora poderosa e uma homenagem direta a esse gigante dos quadrinhos mundiais, que, durante toda a vida, deu existência a heróis, vilões, deuses e lendas que hoje vivem para sempre nas páginas e nas telas.

Kirby e o Cristal de Dobra continua sendo, até hoje, um dos maiores e mais comovente crossover das Tartarugas Ninja — não por reunir universos diferentes, mas por unir o engenho de Donatello à alma imortal de Jack Kirby, o artista que literalmente vive dentro de seus próprios mundos.

Foi o dia em que o “Rei” voltou a desenhar um universo — e uma Tartaruga Ninja testemunhou o milagre da criação. Um encontro improvável, mágico e eterno — como toda boa história em quadrinhos deve ser.

Fonte: Eastman, Kevin; Laird, Peter. Tartarugas Ninja: Coleção Clássica Vol. 2. Rio de Janeiro: Pipoca & Nanquim, 1.ª ed., 2024. 276 p. ISBN 978-85-93695-67-4.

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